domingo, 18 de dezembro de 2022

Dudzicopa 30 - Um jogo pra enterrar qualquer análise

O vigésimo nono e último dia da Copa do Mundo me fez pensar em como vemos futebol, em humildade e em gratidão. Vou explicar:

Antes de a bola rolar uma das possibilidades avaliadas para a escalação da Argentina na final da Copa do Mundo contra a França era a entrada de Di Maria na equipe. Com a escalação dele pela direita de ataque da Argentina, o time poderia fazer dois contra um no lado esquerdo da defesa francesa, já que Mbappé, por opção do técnico, não recompõe por esse lado.

Logo que Scaloni divulgou a escalação, eu e tantos outros comentaristas e metidos a entendidos dissemos: 

 

"Corajosa a opção do Scaloni pois mais do que se preocupar com Mbappé, ele vai fazer Mbappé se preocupar com Di Maria"


Começou o jogo e Di Maria estava na esquerda. Jogando em cima de Koundé que é zagueiro de origem, no lado onde Dembelé, diferentemente de Mbappé, sim ajudava. 

O comentarista mais metido à besta ainda deve ter mandado um "pode ser algo de momento" para não dar o braço a torcer.

Eis que Di Maria passa o jogo todo aberto pela esquerda. 
Ele sofre o pênalti porque Dembelé, que volta pra marcar, deu um totó nele ali. 
Ele marca o segundo gol fechando da esquerda para o meio. 

Tudo isso em um primeiro tempo no qual a França não apareceu para o jogo? Por quê? Ninguém sabe, mas o tuitero e o comentarista tentam:

"Time inexperiente"
"Essa França sempre pareceu um time de momentos apenas" 

Fato é que aos 40 minutos Deschamps, que é mais exaltado pela capacidade de domar o grupo francês do que pela visão de jogo e estilo marcante, decide tirar Giroud e Dembelé para colocar Thuram e Muani. 

O comentarista (eu) tenta explicar...

"Foi afobado o Deschamps"
"Vai deixar o Mbappé mais livre pelo meio,  mas não vai ter ninguém brigando lá na frente"

E apesar do esforço de treinador e analista, nada muda. Nem pra melhor, nem pra pior. A Argentina segue superior no segundo tempo. Desperdiça algumas chances, mas vai carregando o jogo à moda dela, com De Paul apitando, Romero discutindo, Messi ditando, Álvarez brigando... Nem mesmo o Mbappé ficou tão centralizado, posto que ficou para Muani depois de alguns minutos.

Aos 25 minutos o técnico da França dobra a aposta e tenta algo que o time dele nunca fez nessa Copa. Vai pro tudo ou nada no 4-2-4 com Camavinga improvisado de lateral-esquerdo, onde sofreu demais no primeiro tempo contra a Tunísia.

O comentarista (eu) fala:

"Que salada o Deschamps fez! A França vai tentar assim o empate e sem o Griezmann que é o cara da bola parada"


Eis que tudo muda. Um chutão da defesa tem Otamendi soberano na jogada, até que ele decide proteger em vez de combater. Kolo Muani pega a bola e é derrubado. Pênalti. Mbappé, completamente sumido no jogo até os 35 do segundo tempo faz o gol. 

O comentarista (eu) pensa

"É hora do Messi pegar a bola e acalmar o jogo ou tirar a Argentina de trás, tal qual ele fez contra a Austrália"
Messi de fato faz isso. Só para na sequência ser desarmado facilmente por Coman. Dele a bola vai para Rabiot inverter, Mbappé tabelar com Thuram e fazer um golaço, empatando a partida por 2 a 2. 

E a Argentina quase perde o jogo no tempo normal porque o Messi tenta três vezes resolver e perde a bola em duas. Em uma delas, no entanto, há que se dizer; o camisa 10 quase determina a vitória no tempo normal.

Como o comentarista explica tudo isso?  Que tipo de respostas há? A Argentina não deixou de fazer o que fazia bem. A França não começou a jogar muito bem a partir das mudanças. E mesmo assim o jogo estava 2 a 2 e ia para a prorrogação. 

O comentarista (aí não sou eu) já está pensando em tangos de Gardel para explicar a relação conflituosa entre sucesso e fracasso na cultura argentina e na vida de Lionel. 

O outro já pensa no texto sobre Mbappé e a passagem de bastão.

Um terceiro caminha para a sociologia e tenta explicar quase por vias biológicas que os sul-americanos têm sangue quente e os europeus sangue frio e que por isso um soube se comportar e outro não. 



Vem o terceiro gol da Argentina! Explodem bombas, Messi chora. 




O comentarista pega a caneta e começa a procurar tangos de Gardel que expliquem o amor que há pelo futebol bem jogado e pela bola, que procura o craque. 

O outro pensa em um hai-kai com os nomes dos atletas ou num poema construtivista com as letras de Pulga.

Nem dá tempo de lembrar que o Montiel errou o lançamento e que por isso a bola caiu pra tabela e gol do craque. Também não dá tempo de explicar porque o mesmo Montiel abre o braço e comete pênalti, que Mbappé marca. 

Dá sim pra rasgar o hai-kai e a análise tática para buscar outro tango, fazer uma análise psicológica sobre o descontrole do Messi e sugerir que Dibu Martínez não estudou direito o adversário. 

Enquanto fazia isso o comentarista nem viu a defesaça que o Martínez fez contra o Muani agora! Falando nisso... O Muani entrou bem ou mal no jogo? Vamos ver o que o Twitter está falando sobre.... 

Vamos aos pênaltis. O comentarista chuta quem está melhor. O outro (eu) fala que quem bate primeiro normalmente vence. 

Mbappé faz o dele e a história está escrita. 3 gols, pênalti convertido, craque da Copa, passagem de bastão.

Messi caminha pra bola e a linha está escrita. "De novo nas finais, de novo nos pênaltis, Messi... Ops! Fez o gol. Apaga!"

Coman erra o dele. Certamente porque Dibu Martínez estudou muito as cobranças.

E Dybala faz o dele rompendo o mito de que quem entra pra bater pênalti sempre perde. 

Vai Tchouamení de grande Copa e chuta fora. Vai Paredes que perdeu lugar no time pra fazer o dele. 

Agora já tá mais fácil analisar... "Tal qual um tango de Gardel..." 

E vem Montiel que foi bem e depois mal pra terminar a noite bem. 

A Argentina é campeã! 

Foi o triunfo do..... 

....

....


Planejamento?  Não, apaga isso. O cara era interino e foi ficando. 
Da frieza? De jeito nenhum.
Dos escolhidos por Deus?  Pode ser....
Do técnico moderno que se adapta? Acho que dá hein? Desde que a gente esqueça que a Argentina se perdeu de novo num jogo. 

Quer saber? É o triunfo do comentarista! Que viu tudo que os caras lá dentro não viram e muito antes inclusive!  




E com esse texto e essa foto do Lautaro erguendo a taça eu fecho e enterro a série. 

Boa noite comentaristas! Hora de discutir quem fez tudo errado e porquê! 

Parabéns à Argentina!

Obrigado futebol por ser assim! 

sábado, 17 de dezembro de 2022

Dudzicopa 29 - Por mais jogos que "não valham tanto'

O vigésimo oitavo dia de Copa do Mundo me fez em pensar em competitividade e atratividade dos jogos de futebol. O tema me veio à mente pela disputa de terceiro lugar entre Croácia e Marrocos. O começo da partida foi muito bom, mas aos poucos o jogo foi caindo de qualidade pelos muitos erros e trocas de atletas dos dois times. Ainda assim um aspecto curioso é o de que normalmente essas disputas reservam bons jogos para assistirmos, já que "não vale tanto" e "os times estão mais relaxados". As afirmações são quase um senso comum e por isso queria a provocação: 

Se fossem menos competitivos e se valessem menos, os jogos de futebol seriam melhores?




Claro que não é simples assim, mas busco a reflexão. Porque se nós admitimos que alguns jogos são feios, brigados e pouco atrativos porque "não há espaço para erros" e porque "são muito disputados", então seria salutar buscar um jogo onde é permitido se equivocar, não é mesmo? 

Porque se há permissão ao erro, há espaço para o risco. 
E se há o risco, há atratividade e interesse. 
Sim, porque ninguém passaria duas horas na frente da televisão para ver dois times brigando para que nada acontecesse. 

Não é o caso de levar ao extremo de assistir o Fifa Legends Cup com ex-jogadores e suas fortunas se divertindo, mas também não podemos achar que "vale muito" e "não pode errar" sejam parâmetros para definir jogos de alto nível. Afinal, há muitos jogos de várzea que valem muito e no qual não se pode e nem se deve errar pelo bem de todos os envolvidos! Nem por isso eles são bons. 

No fundo me parece que a questão toda está inserida na base do JOGO de futebol. De qualquer jogo na verdade. 

Se joga para quê e pelo quê?
Não é só para ganhar. Ganhar é o objetivo, mas o JOGO não é só o objetivo. 
Entre amadores, é possível dizer que o resultado é basicamente irrelevante e que o legal é bater uma bolinha, tentar um drible, fazer uma defesaça ou um golaço com os amigos e conhecidos. 

Mas entre profissionais também é possível ter essa margem (o golaço, a defesaça, o drible) na medida em que estão reunidos os melhores dos melhores. Não era de se esperar que eles fossem capazes de nos demonstrar habilidades incríveis em vez de medos terríveis? 

Numa das minhas muitas andanças pela internet e por vários textos e ideias a respeito do futebol topei com essa citação aqui. Dizia que era do professor Jan Tamboer, cuja qualificação de acordo com a internet é filósofo do Movimento Humano e do Esporte. A citação é:


"Jogar é a busca pelo incomum, pelo surpreendente, 
pelo tentar tudo que é possível"


É isso que nós queremos ao assistir aos melhores jogadores em campo. Não é a busca pelo resultado, mas sim a busca pelo encanto aliado à competitividade. 

Como resgatamos isso? 
Para mim é diminuindo o peso do erro. Naturalizando o erro e o fracasso. 

Mas há espaço para isso nessa nossa lógica capitalista que mercantiliza tudo e que trata cada ser humano como uma peça a ser descartada, substituída ou defeituosa por não cumprir as expectativas financeiras, morais, profissionais e de outros? 

Acho que só indo para o amadorismo novamente. 

Acho que não vai dar... 

sexta-feira, 16 de dezembro de 2022

Dudzicopa 28 - A despedida de Modric

O vigésimo sétimo dia da Copa do Mundo me fez pensar em Modric. Sim, de novo em Modric. Porque amanhã deve ser o último jogo do craque croata em Mundiais. Eu fico pensando em Modric e lembrando de Hagi, de Lechkov, de Hasan Şaş, de Landon Donovan e de James Rodríguez...

Falo desses meias imponentes que aparecem nas Copas e marcam algumas seleções menos tradicionais do futebol. Sei que Hagi 90 foi o breakthrough, mas falo de Hagi 94, capitaneando a Romênia para as quartas de final quando estava no Brescia. E obviamente sei que Modric já era multicampeão e conhecido em 2018, mas me parece que aquela Copa é o momento em que ele deixa de ser uma das peças do meio de campo do Real Madrid para ser um craque levando um time adiante. Ao menos é isso que me lembro e sinto. Então nesse sentido ele está nesse grupo que citei.

O que eu acho mais curioso é lembrar que Modric nem sempre foi Modric. Em 2008 ele chegou ao Tottenham sendo disputado por equipes inglesas, mas aos 23 anos não estava nem perto de ser o jogador que é hoje. Tanto é que demorou para encontrar posição (jogou de ponta-esquerda e 10 atrás de um atacante nos Spurs) e demorou para engrenar. Quando o fez a temporada já era a 2010-11 e Modric, com 26 anos, tinha "falhado" em levar a Croácia para a Copa da África do Sul. 

A chegada ao Real Madrid foi na temporada 2012-13, mas era o time do Mourinho e o croata ficou no banco de Xabi Alonso, Khedira e Ozil. Em 2013-14 ele teve uma boa temporada como titular, mas a 14-15 foi marcada por uma lesão grave que o tirou dos campos por três meses. É só a partir da metade de 2015 que ele alcança a marca de intocável e encantador meiocampista do time. Só aos 30 anos! Que bom que deu certo para ele, mas vale  lembrar que o caminho do jogador de futebol às vezes é bem torto.

Falando nisso, uma curiosidade: em 2014 eu tive a oportunidade de falar com o craque croata face a face. Foi durante a Copa, após o jogo da Croácia contra o México na Arena Pernambuco (a foto abaixo foi tirada por mim na arquibancada). Os croatas perderam por 3 a 1 e ficaram fora do Mundial. No dia anterior, Modric havia cravado que os croatas venceriam.



 
Na zona mista, após a derrota, Modric passou na minha frente. Estava bravo, claro (ele, não eu). Eu e outros colegas resolvemos chamar...
Ele parou.
Veio falar com a gente após a eliminação. 


Eu não lembro se mais alguém perguntou e nem o quê, mas eu lembro que consegui fazer uma pergunta para ele. Não me orgulho do que perguntei, mas acho que ele deu uma resposta à altura.

Eu: - Ontem você disse que tinha certeza da vitória. O que aconteceu? 

 

Modric: - O que você espera que eu diga? Eu achava que éramos melhores e sigo achando que somos melhores, mas não conseguimos vencer. 


Na época eu lembro que fiquei me achando por ter irritado o Modric. 
Mas depois eu me senti envergonhado. 

O cara tava fora da Copa e parou pra falar comigo. E eu fui lá e quis questioná-lo por ter autoconfiança... 


Naquela Copa ele não jogou nada. Era esse Modric aqui:




Na seguinte foi o craque e Bola de Ouro. 

A vida seguiu e amanhã ele deve se despedir com um Mundial inferior ao de 18, mas superior aos de 06 e 14. 


Ah! Acho que teremos um bom jogo amanhã! Marrocos vai pra cima será? 

quinta-feira, 15 de dezembro de 2022

Dudzicopa 27 - Tentando prever quem será campeão

O vigésimo sexto dia da Copa do Mundo - o penúltimo sem jogos antes do fim do Mundial - me fez pensar em quem é o favorito para ganhar a taça no domingo. 

Essa pergunta sobre quem é o favorito ou sobre quem ganha tal jogo é a base da pirâmide de todo o jornalismo esportivo. Não importa que o jogo seja imprevisível e recorrentemente atestemos isso. Não é o caso de pensar nas muitas variáveis envolvidas, tampouco em desfrutar o jogo ou em tentar imaginar como os dois times vão encarar a partida. O que o povo quer saber é quem vai ganhar. 

Não dá pra culpá-los. Os meus protestos não são em relação aos indivíduos fora do jornalismo esportivo e sim aos de dentro, que alimentaram e se alimentam desse tipo de superficialidade e impedem o entendimento mais amplo. 

Lamúrias à parte, eu sigo respondendo a essa pergunta e às vezes até falando sobre isso sem ser perguntado. Confesso que na maioria das vezes é um chute qualquer, mas eu ao longo dos anos tentei desenvolver um método para tentar me afastar dos sentimentos e achismos envolvidos. 

Foi meio por vias tortas, mas acabei seguindo quase ipsis literis o que meu técnico favorito Marcelo Bielsa disse nessa palestra aqui: 
O mote do trecho foi tratar da importância do aspecto emocional para o jogo, mas Bielsa fala sobre jogos dentro de jogos e acaba nos oferecendo uma hierarquização dos aspectos de uma partida. Em linhas gerais para ele a ordem de grandeza para ganhar jogos é: 

- Técnica
- Física
- Emocional (que mexe com as duas primeiras)
- Tática 

Eu mal-e-mal tento seguir essa ordem. Então falo aqui detidamente sobre França e Argentina.


Partida técnica

Antes de pensar mais a fundo, me pareceu um duelo que tecnicamente seria equilibrado. Depois de refletir um pouco mais, sigo dizendo que é equilibrado, mas me parece que há uma vantagem francesa. Para tanto, decidi quantificar o quão bons eu acho os jogadores de um e de outro time. Usei a minha percepção sobre os jogadores e atribui um número como se fosse um Overall do Fifa. Colocarei apenas os prováveis titulares de um e de outro para vocês entenderem meu raciocínio e lembro que utilizei como critério o que eles tem jogado na seleção. 


Lloris (80)  x  (75)  Martínez

Koundé (75)  x (70)  Molina
Upamecano (85)  x (75)  Romero
Varane (80)  x  (75)  Otamendi 
Hernández (80)  x  (70 Acuña/Tagliafico 

Tchouameni (75) x (70)  Paredes
Rabiot (70)    x  (75 De Paul
Griezmann (90)  x  (75)   Enzo 

Dembelé (75)  x (70)  Mac Allister 
Mbappé  (90)  x  (95)  Messi 

Giroud (80)   x  (80)  Álvarez 
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Total:  França (880)  x   (830)  Argentina


Partida física

É muito complicado de fazer juízo de valor sobre essa parte. Nós não temos os dados. Não sabemos a condição médica dos jogadores e nem a intensidade dos treinos.  Temos percepções sobre intensidade e características dos atletas e dos times e eu tenho a impressão de que a França chega mais inteira. Além disso, como o @zeschultz me lembrou no Twitter, a Argentina tem um dia a mais de descanso, pois jogou antes. 

De toda a forma, já que a Fifa disponibiliza alguns dados, vale trazê-los. 

Minutos jogados: França (595 e em um jogo iniciou com reservas) x  (613)  Argentina
Quilômetros percorridos:  França (654,6)  x  (682,1) Argentina


Partida Emocional (que alimenta as duas primeiras)

Aqui eu não vou achar nenhum dado para ajudar. Só tenho meu feeling e percepções para construir algo. O que eu sinto sobre esse time da Argentina é que ele está sempre à beira do precipício, mas que também por isso consegue criar situações de genialidade e sincronia com seus atletas e torcedores. O que eu sinto da França é que é um time meio blasé. Que joga só quando precisa. Não é frio, porque toma pressão e gols, mas parecem ter uma certeza de que no final sairão vencedores... Aí vai de cada um o que pesa mais. Eu fico com o emocional francês e esse ar impávido, embora reconheça o corazón argentino. 

Partida Tática

Aqui vejo uma pequena vantagem argentina pelo fato de ter mudado de esquema algumas vezes durante a Copa e por ter alguns jogadores versáteis que podem responder bem a diferentes cenários. O fato de se aproximarem para jogar também tem algo tático que pode quebrar a marcação adversária e, claro, os argentinos têm o cara mais capaz de desequilibrar e dinamitar uma estrutura defensiva nesse Mundial na figura de Messi. Mbappé é o segundo. Ainda há a bola parada e nesse sentido vejo vantagens francesas com as batidas de Griezmann. 

******

Misturando tudo no liquidificador, me parece que é "A FRANÇA É QUE VAI LEVAR", mas no próprio vídeo Bielsa cita a SORTE. Vamos ver de que lado ela estará. 


quarta-feira, 14 de dezembro de 2022

Dudzicopa 26 - Desvios que decidem

O vigésimo quinto dia da Copa do Mundo me fez pensar em pequenos desvios. Não de trânsito, nem de septo, mas sim de chutes desviados que se transformam em gols e grandes chances. 

Os dois da França hoje vieram assim. 

Depois do jogo terminado é meio que tanto faz, mas eu queria pegar nesse ponto porque o desvio quebra muita coisa. O desvio não é calculado, nem pra quem chuta, nem pra quem defende. Então é um fator de imprevisibilidade tal qual um drible, uma finta, um pé que bate no outro, uma bola que para na poça d'água, uma espalmada do goleiro ou um erro não forçado. 

Agora tal qual um drible, uma finta e um chute errado há condições que podem ser criadas para que um desvio possa ser determinante. A saber... Atacar com muita gente, obrigar o adversário a recuar, chutar a gol, etc. 

Enquanto escrevia isso me lembrei da Copa de Mundo de 2018. Naquela Copa eu me lembro que houve muitos gols a partir de desvios e bloqueios dos jogadores. Até revi todos os gols do Mundial pra ver se estava equivocado. Não estava. Seguem:

- Bola desviada em Cionek (POL), vira gol de Senegal

- Dzyuba (RUS) contra Egito

- Diego Costa (ESP) contra Irã

- Mbappé (FRA) contra Peru

- Kane (ING)  contra Panamá

- Bola desviada em Cheryshev (RUS) vira gol da Inglaterra

- Bola desviada em Meriah (TUN) vira gol do Panamá 

- Jorgensen (DIN) contra Croácia

- Mandzukic (CRO) contra Dinamarca

- Fosberg (SUE) contra Suíça

Em muitos desses gols as situações eram de marcadores muito próximos ao próprio gol ou de atletas sem a postura corporal adequada para bloquear chutes, sendo apenas capazes de desviá-los (sim, tem gente estudando isso). 

Então volto para a questão marroquina. Como é um time muito aguerrido, que marca com muita gente, natural que em vários lances haja um mar de camisetas de Marrocos se jogando para tirar a bola. O esforço é louvável e deve ser exaltado, mas hoje facilitou as coisas para a França.... 

Era caso de não tentar desviar? Claro que não. 
Mas talvez uma melhor execução para tentar defender mais à frente pudesse gerar situações mais difíceis para desvios determinantes.

Não é uma simples escolha, mas vale o alerta sobre recuar demais para marcar. 
E vale o alerta que num dia diferente esses dois desvios aqui poderiam cair em outros pés: 






E esse aqui poderia ter sido gol... 




Acasos, ocasos e o caos do futebol. 

Segue adiante a França. 

terça-feira, 13 de dezembro de 2022

Dudzicopa 25 - O Messi, o Modric e a Copa

O vigésimo quarto dia da Copa do Mundo me fez pensar em um monte de coisas, mas principalmente sobre sentimentos e sensações. Sempre acho difícil esse tipo de comentário quando envolve o futebol porque fica uma coisa sem substância, muito na base dos floreios e de visões extremamente subjetivas sobre o jogo. Às vezes é até piegas mesmo. Uma coisa que a gente fica indo atrás pra justificar algo que a gente gostaria que fosse verdade. Mas é que hoje estou assim. 

Hoje fiquei pensando no Messi, no Modric e nas histórias que serão e podem ser contadas sobre os dois.

Porque até os 20 minutos de jogo o que a gente tinha na primeira semifinal da Copa era o seguinte: Modric com a bola, participando do jogo. Argentina correndo atrás e Messi aparecendo apenas com duas perdas de bola, uma no ataque que gerou contragolpe e outra na defesa que os companheiros remendaram.

A partir dos 20 o jogo foi começando a mudar, junto com o caminho dos dois camisas 10. Messi passou a recuar para jogar mais e ajudar na circulação de bola do time dele. Modric, em seu melhor momento na partida, deu um drible no meio das pernas de um argentino e armou o ataque que terminou com Perisic finalizando por cima do gol. 

Aqui um momento digno do futebol e seus contrastes. A finalização de Perisic aos 30 minutos foi desviada por De Paul, mas a arbitragem marcou tiro de meta. Nesse tiro de meta, Otamendi recebeu e forçou um passe para o meio de campo. A bola foi em cima de Modric, que por algum motivo não conseguiu dominar (frame abaixo), o que acabou amaciando para Enzo Fernández iniciar a jogada do pênalti que Messi converte. 



Esse é o futebol. 

Por isso que as autópsias de resultados e sugestões do que poderia ter sido feito para evitá-los são inócuas. Nesse caso o juiz apitar direito, Modric parar a bola, Gvardiol reconhecer que era uma bola descoberta e Livakovic não cometer o pênalti poderiam ter salvado a Croácia de sofrer o primeiro gol....

Mas nada disso é estrutural ou sistêmico e sim circunstancial. E essa cadeia de fatos ajudou em mais um jogo memorável de Messi.

Sim, porque depois do 1 a 0 foi muito difícil para a Croácia e para Modric voltar. Pior... Aos 38, Modric cobra um escanteio curto. Álvarez bloqueia o cruzamento subsequente e corre mais de 50 metros com a bola para fazer o segundo gol. 

Enquanto isso Messi passou a se encher de confiança. Pegava a bola, carregava, driblava... Parecia ensaiar o que estava por vir no segundo tempo, no baile que deu em Gvardiol. 

Messi da finalização cirúrgica contra o México. 
Messi do chute sem espaço e das carregadas nos acréscimos contra a Austrália
Messi do passe genial para Molina 
Agora é também Messi da jogadaça para o três a zero na Croácia

Enquanto isso, Modric do tempo, do espaço, o Zinedine Modric da partida contra o Brasil se despediu da Copa com um chute travado que voltou no próprio rosto... E numa noite que tinha começado tão bem para um e tão mal para outro, os papéis se inverteram.

Ainda assim, há que ser dito:

Modric deixa a Copa como um dos grandes jogadores da história dos Mundiais, mesmo sem vencê-la. 

Messi ainda está na Copa, mas se não vencer domingo provavelmente será lembrado como amarelão, pipoca ou fracassado por ter conseguido tanto, mas não tudo neste esporte.


segunda-feira, 12 de dezembro de 2022

Dudzicopa 24 - Pensamentos sobre as semifinais

O vigésimo terceiro dia da Copa do Mundo - mais um sem jogos - me fez pensar em como podem se desenrolar as semifinais da competição. 

Nesta terça-feira a Argentina enfrenta a Croácia em um jogo no qual o favoritismo deveria ser da albiceleste, mas que na prática tem tudo para ser extremamente equilibrado, dados os feitos dos croatas até aqui e a inconstância dos sul-americanos. Vale lembrar, no entanto, que a Argentina joga diferente de Bélgica e Brasil. Se os dois últimos apostam muito na capacidade de afastar jogadores para abrir espaços, os argentinos gostam de se aproximar para jogar. Isso pode sobrecarregar o trio de meiocampistas croatas. Aliás o Japão mostrou bem o quanto podem ser expostos Brozovic, Modric e Kovacic quando colocam-se peças no espaço ao lado do primeiro volante. A turma tática chama de meio-espaço (halfspace). É no entrelinha, mas deslocado pra um lado ou pro outro. A imagem que eu fiz no paint deixa mais claro:



Ali onde coloquei os dois círculos amarelos com dois potenciais jogadores argentinos. É o espaço à frente da zaga, ao lado do primeiro volante e nas costas dos dois oitos da Croácia. O Japão colocou Doan e Kamada nesses locais e foi superior no primeiro tempo. Na etapa complementar, no entanto, Gvardiol e Lovren deram alguns passos à frente e mataram esse espaço. Fazer isso contra Julián Álvarez, porém, pode trazer problemas. 

Com Messi, Mac Allister e até Di Maria, me parece que a Argentina tem um potencial ainda maior para explorar essa zona do campo, principalmente se conseguir ditar o ritmo do confronto. Nesse sentido, as dúvidas sobre esquema tático são muito válidas e interessantes. Os japoneses utilizaram um 3-4-2-1 para explorar esses espaços que citei. Diante da Holanda a Argentina foi num 3-1-4-2. Basta uma pequena adaptação em Enzo e Messi para isso acontecer.  

Agora, se não conseguir ditar o ritmo, a Argentina corre o risco de ficar correndo de um lado para o outro tentando encontrar os três e a troca de passes lenta do rival. Diferentemente do Brasil, no entanto, a Argentina não se garante tanto lá atrás, de forma que os atacantes podem ter mais vantagens para marcar diferenças. 


E Marrocos e França? 

Não tem como fugir do óbvio... O jogo de quarta-feira é sobre a França tentando entrar na defesa marroquina, que sofreu apenas um gol em cinco partidas. O que acho que os franceses têm e os outros não têm são os pontas capazes de explorar a profundidade do campo. Falo de Mbappé e Dembelé. E nessa imagem aqui (ignorem os números dos marroquinos e tenham em mente só os três da frente na França) fica mais fácil de visualizar:



11 e 10 de azul são Mbappé e Dembelé. Marrocos tem como grande qualidade a compactação e sincronia de movimentos entre todos os seus jogadores. As distâncias são curtas, os timings são corretos e os botes certeiros. O time, no entanto, por necessidade precisa estar longe do próprio goleiro. Portugal tentou expor isso no primeiro tempo do duelo entre os dois, mas não encaixou quase nenhum dos lançamentos tentados. A velocidade de Mbappé e Dembelé pode ser um diferencial para fazer os marroquinos recalcularem toda a vez a altura em relação a Bono, o que pode gerar brechas na defesa ou chances claras para os dois finalizarem. 

A ver também se a ocasião não pesa para os marroquinos, que estão sempre no limite entre a coragem e a irresponsabilidade. Vamos ver se contra a França, Ounahi vai carregar a bola como tem carregado, se Amrabat acerta todos os botes e se Ziyech e Boufal vão inverter e driblar como nas primeiras partidas.


Vamos ver. 



domingo, 11 de dezembro de 2022

Dudzicopa 23 - A queda sem culpados

O vigésimo segundo dia de Copa do Mundo - outro sem jogos - me fez pensar mais um pouco na eliminação da seleção brasileira diante da Croácia. Enquanto a mídia já parte para o próximo treinador e especula candidatos para gerar engajamento, eu ainda estou na fase de analisar o Tite e a equipe dele. 




Penso que essa eliminação para a Croácia é uma das mais traumáticas da história da seleção brasileira. Porque não dá pra culpar ninguém pela derrota exatamente.

Claro que se você quiser você dá um jeito de falar mal da decisão de o Neymar cobrar lá na frente ou do Rodrygo perder pênalti ou do Casemiro que não fez a falta. No entanto, isso tudo perde peso perante a constatação de que o Brasil dominou e criou para vencer, mas ainda assim perdeu. Tinha todos os jogadores em campo. Não teve ninguém expulso. Não foi roubado pelo juiz. Não enfrentou um esquadrão. Não teve nem a desculpa de calor, clima ou de um erro grosseiro de algum atleta. 

É bem diferente do que vimos nas derrotas da seleção ao menos de 74 para cá. Pelo menos é o que eu ouço. Se eu falar bobagem me corrijam:

Em 74 o Brasil estava muito desfalcado, não tinha Pelé e pegou a Laranja Mecânica na segunda fase. 
Em 78 fica pra história a ideia de conchavo e trapaça argentina para avançar. Nem precisa provar nada, é só a ideia de que a culpa está ali. 
Em 82 a culpa foi de Cerezo, da ingenuidade brasileira e do fim do futebol arte. 
Em 86 Zico perdeu pênalti e Carlos teve azar com a bola na trave e nas costas.
Em 90 a culpa evidentemente era de Lazaroni, seus três zagueiros e a Era Dunga. 
Em 98 culpa das convulsões de Ronaldo na decisão. 
Em 2006 foi a preparação muito aberta em Weggis e os craques acima do peso e descompromissados.
Em 2010 foram Dunga e Felipe Melo. 
Em 2014 não tínhamos Neymar e o descontrole emocional do "ultrapassado" Felipão passou recibo. 
Em 2018 a culpa era do Fernandinho, das quedas do Neymar e do Gabriel Jesus que não fazia gol.

E chegamos a 22. 
O Brasil fez "tudo certo" e mesmo assim perdeu. 

Isso é doloroso e eu imagino que para o Tite está sendo ainda mais. 
Ele diz que está em paz e pode ser que realmente esteja, mas é inevitável ponderar que, depois de seis anos de preparação, o time fez tudo o que ele queria e mesmo assim não foi o bastante. 

Agora digo eu...  Tite não é o culpado dessa eliminação, mas é preciso concentrar o olhar no que o time dele jogou em duas Copas. Ao todo Tite teve dez jogos. Foram:

6 vitórias - Sérvia (2x), Costa Rica, México, Suíça e Coreia do Sul
2 empates - Suíça e Croácia
2 derrotas - Bélgica e Camarões 

Dessas partidas, em quantas o Brasil encantou ou jogou muito muito bem? Coreia e México talvez? 

Uma seleção redondinha, competitiva e competente, mas que em Copas do Mundo jogou muito pouco e que não pegou nenhuma camisa pesada. Uma seleção que "fez tudo certo e ainda assim perdeu".  Que não tem nem a quem culpar... 

Dói mais ou menos? 




sábado, 10 de dezembro de 2022

Dudzicopa 22 - Outra vez a coragem

O vigésimo primeiro dia da Copa do Mundo me fez refletir outra vez sobre a coragem no futebol de alto nível. Porque o que o Marrocos fez contra Portugal não é só aplicação tática, concentração e vigor físico. É coragem também. Ou é coragem principalmente. O primeiro tempo foi uma mostra disso. Além de controlar bem os portugueses, que não tentaram destrancar o cadeado, mas sim passar por cima dele com lançamentos, os marroquinos sempre tentaram ser corajosos com as bolas nos pés. 

Em vez do passe simples, o passe arriscado.
Em vez de dar o chutão, veio a carregada de bola.
Na ausência de opções vinha o drible ou a inversão de lado. 




O gol marroquino é uma ode à coragem. É uma construção de gol a gol do time africano, com troca de passes desde a defesa. São 50 segundos de posse de bola e 16 passes (um numa tabela com o adversário) até o gol de En-Nesyri. Isso nas quartas de final da Copa do Mundo. Tem time parrudo, campeão mundial que não faz isso.

E como foram corajosos também Amrabat e Ounahi para carregar a bola mesmo quando marcados por dois ou três no segundo tempo do jogo.

Aos portugueses não faltou coragem, mas talvez um pouco mais de confiança de que o talento se encontrando mais poderia decidir. Aliás é um tapa no rosto deste comentarista que acreditava que a rigidez posicional da Espanha é que tinha impedido um melhor resultado. Portugal da aproximação e craques livres pouco criou também e sucumbiu, vejam só, à "falta de ideias".

Sobre coragem... Eu achei os ingleses muito corajosos contra a França. A gente tem uma imagem dos atletas de grandes clubes da Premier League, mas a Inglaterra como seleção não está no nível das principais (e dos franceses) em tradição e autoridade dentro de campo. Mas o que nós vimos hoje nas quartas de final da Copa do Mundo foi uma atuação de seleção gigante. 

Tabelas, carregadas de bola à frente. Saka e Bellingham sempre tentando um algo mais.
Os ingleses buscaram o empate uma vez e tiveram a chance da segunda igualdade. Kane, no entanto, desperdiçou. E que coisa são os pênaltis e a história do English Team huh?

Em 90 caiu para a Alemanha Ocidental nas penalidades. Em 92 caiu pra mesma Alemanha na Euro também nos pênaltis. Em 98 foi eliminada pela Argentina nos pênaltis. Na Euro 2004 e Copa 2006 caiu para Portugal nos pênaltis. Na Euro 2020 perdeu o título para a Itália nos pênaltis e agora caiu para a França por um pênalti perdido no fim do jogo. 

A exceção na história inglesa dos últimos 30 anos foi contra a Colômbia na Copa de 2018. 

Haja coragem pra pegar a bola e bater pênalti com essa camisa! 

sexta-feira, 9 de dezembro de 2022

Dudzicopa 21 - O jogo dos contrastes

O vigésimo dia da Copa do Mundo foi de tirar o fôlego. No fim só consigo pensar nos antônimos. No inverso. Nas contradições. No +1 e no -1. Luz e sombra. Há muitas maneiras de vencer no futebol e às vezes as duas aparecem num mesmo jogo... 

Por exemplo, o Brasil da posse de bola, do perde e pressiona e dos pontas que desequilibram, não teve nem posse, nem pressão e nem pontas no primeiro tempo contra a Croácia, que com passes lentos e marcação forte viu Modric se vestir de Zidane 2006 para controlar a equipe brasileira. 


No segundo tempo o Brasil preparado, confiante e ofensivo apareceu, mas Neymar e Paquetá pararam no goleiro do Dínamo Zagreb, Livakovic. Vai entender! 

A Croácia tratava de não perder e tentou com um centroavante que mal dominava a bola ter um pouco mais de presença ofensiva. O futebol é tão matreiro que o centroavante que não conseguia dominar uma bola deu uma caneta no defensor brasileiro e serviu um companheiro que quase fez. Tudo isso para na sequência o Brasil do ataque posicional aproximar jogadores e fazer uma tabela a la 82 para abrir o placar no Lusail.

Daí pra frente era só administrar o jogo, algo muito corriqueiro para esse time do Brasil. Tão corriqueiro que os próprios jogadores devem ter acreditado que a vitória viria sem tantos esforços até o fim do jogo. Afinal, a Croácia estava em frangalhos fisicamente e o goleiro Alisson não tinha feito sequer uma defesa em 117 minutos. Dava até pro Fred ir dar combate na linha de fundo, pro Danilo correr pra trás, pra três jogadores ficarem à frente da bola e pra Casemiro pensar nas semifinais e não fazer a falta em Zinedine Modric, certo? 

E o destino que mandou a bola no pé do Petkovic, que não conseguia dominar uma bola antes? Justo o croata com nome de ídolo rubro-negro no jogo em que já estavam malhando o treinador por tirar um ex-flamenguista? 

Pois é. Fomos para os pênaltis e na marca da cal o prodígio do Real Madrid e o capitão do PSG pararam no goleiro do Dínamo Zagreb, enquanto o meia-atacante do mesmo time, o ponta do Rennes e o 10 do Torino venceram o goleiro do Liverpool. Ah sim! Zinedine Modric também fez o dele. 

E assim o Brasil está fora da Copa.

Mal nos recuperamos dessa aula dos antônimos, surpresas e histórias e Argentina e Holanda começaram a disputar outra vaga nas semifinais. Em um jogo de encaixes individuais de marcação, a genialidade de Messi decidiu. E no mesmo jogo o cruzamento pra dois grandões decidiu também! Fora a falta ensaiada com bola no chão pra um cara de 2 metros de altura aos 50 do segundo tempo! 

Expliquem essa aí! 
Expliquem Dibu Martínez pegando dois pênaltis do jeito que foi. 

Expliquem a Scaloneta e seu descontrole a favor e contra estar nas semifinais e o Brasil do PROCESSO, meritocracia e organização estar fora!

Expliquem e depois me contem se falei bobagem! Ou só a segunda parte...

Vou dormir! 


quinta-feira, 8 de dezembro de 2022

Dudzicopa 20 - Projetando as quartas de final

 O décimo nono dia da Copa do Mundo, o segundo sem jogos, me fez pensar nas partidas de amanhã! Para além de estudar os atletas e ver os jogos anteriores, faz parte do meu trabalho como comentarista imaginar como os treinadores podem estar pensando o confronto. Quais estratégias e escalações podem ser usadas para atingir o objetivo. Ou se não faz parte do meu trabalho, eu ao menos gosto bastante disso. 

Vou compartilhar o que eu penso que pode acontecer nos jogos de amanhã pelas quartas de final da Copa do Mundo. Começando com....


BRASIL X CROÁCIA

Bom, a seleção brasileira é muito favorita nesse jogo. Para mim é coisa de 90% a 10. Não que os croatas sejam ruins, mas os brasileiros são muito bons e a maneira de jogar dos dois times me parece favorecer os Tite Boys. A Croácia gosta de toque de bola e tem atletas técnicos no meio de campo, enquanto na linha defensiva tem, Gvardiol à parte, atletas de um nível inferior ao dos principais atacantes do Mundial a meu ver. O que o Brasil mais gosta é de pressionar quem tem a bola e esticar para os pontas resolverem no um contra um. Se a Croácia quiser ter a bola - e ela precisa porque do contrário não tem desequilíbrio com Brozovic, Modric e Kovacic - vai correr o risco de sucumbir ao perde e pressiona brasileiro. Além disso a linha defensiva será constantemente exposta por Raphinha e Vinícius Júnior, que vão receber a bola dos volantes, mas também dos zagueiros brasileiros, que lançam muito bem. 

Pensando em tudo isso, imaginei que a Croácia poderia pensar em algo parecido com uma linha de cinco defensores lá atrás, sendo um deles Perisic como ala esquerdo. 




O recuo de Perisic poderia ajudar a limitar o espaço que Raphinha teria na direita, permitindo ainda que Barinovic, Lovren, Gvardiol e Juranovic ficassem próximos para evitar maiores danos. Ao mesmo tempo, Perisic poderia puxar os contragolpes croatas. Os 3 meias seguiriam escalados e teriam a difícil tarefa de tentar dar conta de Neymar e Paquetá, além de recuar para ajudar a dobrar pelos lados do campo quando fosse necessário. Na frente, Kramaric e Livaja fariam o melhor possível para tapar Casemiro e os lançamentos de Thiago Silva. 

Repito: as chances são mínimas, mas me parece que essa seria a melhor forma de parar a seleção brasileira. Contra os comandados de Tite você não pode dar o lado do campo. Raphinha e Vinícius desequilibram muito! Ficar com a bola é uma opção, mas o risco de os 3 do meio serem desarmados pelo perde e pressiona do Brasil é gigante. 

HOLANDA X ARGENTINA


Aqui acho que há muito equilíbrio, de forma que busquei pensar em como os dois times jogam e como pode ser o duelo em campo. Os holandeses tem um jogo mais rígido do ponto de vista posicional, mas com movimentações de aproximação dos três da frente. Sem a bola fazem encaixes individuais que podem prejudicar muito a fluidez dos argentinos, que aproximam seus jogadores para jogar o tempo todo. Pode ficar um perde e ganha danado ali no meio. 



Van Gaal vai ter que pensar até onde os zagueiros devem ir para dar bote e se os alas vão alinhas com meiocampistas ou com os "pontas" argentinos. Entre aspas porque pela esquerda ora Mac Allister, ora Álvarez, mas nenhum dos dois têm as características de Di Maria, por exemplo. Do lado argentino os laterais podem sofrer com as duplas ou até trios que os holandeses fazem. Bola parada holandesa também pode ganhar o jogo. 

O único "detalhe" que não citei foi Messi... O que será que ele vai aprontar? Vir na defesa buscar jogo?  Cair pra direita pra fazer 3 contra 3 com De Paul e Di Maria? É uma incógnita. O tipo de incógnita que pode bagunçar o plano de Van Gaal. 

quarta-feira, 7 de dezembro de 2022

Dudzicopa 19 - La pausa

O décimo oitavo dia da Copa do Mundo foi o primeiro sem Copa do Mundo desde que ela começou. Enquanto muita gente ficou angustiada pela falta de jogos, eu confesso que fiquei aliviado. Não que não goste das partidas, pelo contrário, mas sim porque me parece bom ter uma pausa para absorver algumas coisas e pensar em outras. Do jeito que estávamos, para mim os jogos estavam se misturando uns nos outros, o que também impactou na minha capacidade de encantamento com alguns deles.

A pausa ajuda. 

E foi pensando na pausa e no tema para o texto de hoje que encontrei a pausa como tema para hoje.

Como assim? Bom, sem jogos nesta quarta-feira decidi ir atrás de alguns números da Copa do Mundo para ver se encontrava alguma coisa interessante. Foi aí que encontrei ele: Lionel Messi. Não que seja uma surpresa. A Copa do homem é muito boa. O que eu não esperava é que os números fossem tão bons para além dos 3 gols marcados até aqui.



De acordo com a plataforma Wyscout, Messi é na média por 90 minutos:

2º em participações esperadas em gols  (gols esperados + assistências esperadas), perdendo só de Mbappé.
4º em chutes a gol (está atrás de Rashford, Mbappé e Mskani)
6º em dribles  (atrás de Musiala, Di Maria, Mbappé, Neymar e Dembelé)
2º em passes em profundidade (atrás de Shaqiri)

Isso tudo com 412 minutos em campo, que é a maior marca entre os jogadores que não disputaram prorrogação na Copa do Mundo. Ou seja... Não é que foram poucos minutos e bons números nesses minutos e sim que mesmo com o desgaste de situações e partidas, Messi conseguiu essas marcas. Claro que há números não tão bons, mas me parece que dentro do que se espera de atacantes no Mundial, só Mbappé tem entregado mais. E o francês tem 23 anos, jogando num time mais bem estruturado. 

De posse desses números e interesse fui então buscar quanto Messe tem se movimentado nas partidas. 

Contra a Arábia Saudita foram 7,8 km, sendo 4,6 deles com velocidade entre 0 e 7km/h (caminhando)
Contra o México foram 8,4 km, sendo 4,9 deles caminhando
Diante da Polônia foram 8,2 km, sendo 4,7 caminhando
E contra a Austrália foram 8,5 km, com 4,7 caminhando. 

Para quem não se liga muito nesses números, normalmente os principais jogadores de uma partida passam de 11 km percorridos. 

Eu, no entanto, quebrei a cara porque fui atrás de outros craques e acabei vendo que La Pulga está na média. 

Mbappé nos jogos que fez correu 8,5 (4,2 andando), 8,1 (4,2 andando) e 7,7 (4,2 andando)
Neymar nos jogos que fez correu 8,4 (2,2 andando) e 7,9 (3,3 andando) 
Cristiano Ronaldo nos jogos que fez correu 8,2 (3,7 andando) e 8,2 (3,4 andando) 

Pensei em alguns outros 10/9,5 para comparar:

Gakpo correu 10,9 km (3,6 andando) contra os Estados Unidos
Bruno Fernandes fez 10,5 (3,5 andando) contra a Suíça
Modric fez 9,6 km, 9,8 km e 11,1 km na fase de grupos
Ziyech fez 9,8, 9,7 km e 7,7 km na fase de grupos

Nem fui atrás de Bellingham, Griezmann, algum japonês e outros porque certamente eles correm mais a cada jogo. 

Qual a conclusão tiramos de tudo isso? Conclusão mesmo nenhuma, mas vale pensar e lembrar que mais do que correr muito é preciso correr bem para decidir os jogos. Os argentinos costumam falar em "la pausa" para definir momentos em que os craques e enganches tiram a velocidade do jogo e cadenciam partidas normalmente marcadas pela alta velocidade de jogadores menos talentosos. Vou me apropriar aqui:

La pausa dos jogos me permitiu ver la pausa de Messi e outros!








terça-feira, 6 de dezembro de 2022

Dudzicopa 18 - Aproximar ou afastar para jogar

O décimo sétimo dia da Copa do Mundo outra vez me fez pensar nas diferentes formas de enxergar o jogo e naquilo que os treinadores precisam considerar na hora de decidir como querem que suas equipes joguem. Falo especificamente das diferenças nas formas que Espanha e Portugal atuaram na tarde desta terça-feira. 

Fundamentalmente estamos falando da ideia de aproximar jogadores para jogar ou afastá-los para abrir espaços na defesa do adversário. Eu já tratei desse tema no Dudzicopa quando falei da estreia da Espanha e da simetria no campo, da intensidade dos EUA para bagunçar a Inglaterra e da cultura futebolística de cada país e do lugar disso na Copa

Talvez eu esteja meio fissurado nisso, mas estou arranjando muitas explicações decorrentes dessa noção que, para mim, norteia quase tudo que um time faz em campo.

Em resumo: se eu me aproximo pra jogar, eu otimizo um jogo mais curto e dou liberdade quase que total para os jogadores bagunçarem o adversário. Em contrapartida, posso ficar muito dependente de momentos de inspiração ou da capacidade técnica dos atletas. Fora a questão defensiva, que pode resultar em total desorganização.

Se eu me afasto para jogar eu aumento o campo e dificulto a tarefa dos atletas adversários, enquanto aposto em movimentações muito bem coordenadas para aproveitar espaços abertos. Em contrapartida, posso ficar muito previsível e ter atletas influentes alijados do jogo por muito tempo. Na questão defensiva, normalmente estou mais precavido, mas posso sofrer com poucos jogadores próximos da bola. 

É algo muito simplista o que eu disse. Dá pra ter um monte de elementos de um na ideia do outro e evidentemente há muito mais sobre jogar futebol do que isso. Meu objetivo é só frisar a prevalência disso no meu modo de enxergar futebol, sobretudo nos jogos de hoje. 

Para mim a Espanha parou no Marrocos essencialmente porque não conseguiu tirar o adversário de posição. Ou seja, bagunçar a defesa marroquina. Os espanhóis praticam o jogo de posição (ou tentam) e por isso preconizam que os jogadores devem ocupar espaços no campo e que a bola chegará até eles. Coloco aqui imagem do Branko Nikovski, analista e licença A da UEFA para ilustrar:


Ele colocou algumas outras também no post dele:

A Espanha se organiza assim para atacar e o Marrocos fez um grande trabalho para impedir que isso tivesse sucesso. Para que funcionasse, espanhóis precisariam girar mais rápido a bola, ou ter algumas vitórias individuais em dribles, reconhecer o homem livre e dar passes mais agudos. Dava pra ganhar jogando assim, mas não com a execução que eles tiveram, que foi muito muito fraca. Apenas 13 chutes a gol e só um certo em 120 minutos com um xG (gols esperados) de 1,01. Isso com 77% da posse de bola.

Já Portugal adota outra forma de atacar. Inclusive me chamou muito a atenção na preparação para o Mundial naquele amistoso contra a Nigéria (4 a 0) como Fernando Santos instruiu o time a ter amplitude apenas com os laterais e acumulou muita gente pelo meio do campo. Isso tem se repetido nessa Copa do Mundo e aconteceu hoje. Não achei ainda na câmera tática, mas esses prints ajudam:



 


Jogadores se aproximam para jogar. Os pontas não ficam grudados no lado do campo. 
Com isso foi favorecido o jogo de tabelas e movimentação mais curta dos jogadores portugueses. 
Hoje funcionou muito muito bem, embora há que se dizer que a Suíça foi muito mal também. Tanto defendendo quanto tentando desarmar e contra-atacar. 

Os mapas de calor do Sofascore e de passes do @markstatsbot ajudam a visualizar um pouco melhor a diferença entre portugueses e espanhóis na hora de atacar:







Como sempre faço questão de ressaltar, não há certo ou errado, mas sim diferentes formas de interpretar o jogo. A Espanha provavelmente não se daria tão bem aproximando jogadores, pois os atletas convocados tem mais cacoete do jogo de posição. Portugal mais rígido com a posse significaria João Felix preso no lado do campo e Bernardo Silva e Bruno Fernandes se encontrando menos... 

Enfim! Cansei. Vale pensar nisso! 



segunda-feira, 5 de dezembro de 2022

Dudzicopa 17 - Jogos imaginados e nunca jogados

O décimo sexto dia da Copa do Mundo me fez pensar em jogos que deixaram de acontecer. Sim, porque Brasil e Coreia do Sul deveria ter sido jogado como partida de 90, mas de fato acabou em 10 minutos. 



Deixe-me explicar melhor: não é que esteja anulando a vitória brasileira ou anulando o que aconteceu e sim que tudo o que poderia se imaginar para a partida não teve nem chance de ocorrer!

Antes de a bola rolar imaginei a seleção sul-coreana na defesa, frustrando os brasileiros com compactação e boa defesa da própria área, a exemplo do que havia ocorrido contra os uruguaios e em parte contra os portugueses.

Imaginei o Brasil trabalhando duro para conseguir fazer o que os outros adversários não conseguiram. E imaginei até uma possibilidade remota de haver uma surpreendente tomada de vantagem sul-coreana na bola parada, já que o time é alto e bom nesse tipo de jogada.

Não aconteceu. Nos tiraram essa possibilidade.  

Se estou sendo inadequado e colocando você nesse bolo, me desculpe. É que acho que mais gente queria ver a seleção brasileira sendo testada de verdade nas oitavas de final. Não rolou. 

A Coreia do Sul sucumbiu em 10 minutos em um misto de falta de concentração e combatividade, além de inspiração e intensidade da seleção brasileira. O atropelo brasileiro merece créditos, mas a fragilidade sul-coreana precisa ser colocada no pacote.

O segundo tempo foi de um não-jogo, no qual Neymar queria que Raphinha fizesse o gol dele e os sul-coreanos tentavam minimizar a tragédia e pouco mais. 

Não estranhem, mas achei frustrante. É porque minha torcida é pelos grandes jogos na Copa e não necessariamente por uma seleção. Tento repetir com o futebol de seleções o que faço no dia a dia com os clubes a fim de buscar um distanciamento e isenção. É por isso que lamento que a Coreia não tenha conseguido jogar. E é por isso que eu espero que a Croácia tenha mais cuidado e esteja mais ligada. Para que tenhamos um jogo interessante! 

Aliás, qualquer possibilidade disso me parece que passa pela capacidade de Modric, Kovacic e Brozovic ditarem os ritmos da partida. Os três conseguem controlar o jogo, acelerando e reduzindo a velocidade. Juntando e esticando as peças da Croácia no campo. Se eles não fizerem isso, já era. 


E mesmo que eles façam isso, pode não ser o bastante. O Japão fez um primeiro tempo muito bom contra eles a partir do movimento dos pontas (Doan e Kamada) de fora para dentro. Isso os permitiu jogar nas costas de Modric e Kovacic e à frente dos zagueiros croatas, gerando incertezas e linhas de passe promissoras. 

Como o Brasil vai abrir os pontas, esses espaços frágeis dos croatas poderão ser ocupados por Neymar e Paquetá, que têm mais capacidade ainda de fazer estragos. A ver como será a postura para forçar o jogo por dentro ou para o lado sem deixar o Brasil ganhar profundidade. De repente uma linha de 5 com o retorno de Perisic e dois atacantes apertando Thiago Silva e Casemiro na saída de bola, não sei... 

Espero que esse não seja outro jogo apenas imaginado! 

domingo, 4 de dezembro de 2022

Dudzicopa 16 - Como abrir uma defesa

O décimo quinto dia da Copa do Mundo me fez pensar em como os grandes times abrem defesas e como é difícil notar e explicar isso. 

Pensei nisso porque me parece que a chave das classificações de França e Inglaterra foi fazer o primeiro gol em um cenário complicado de marcação bem feita pelos adversários. No caso da França houve momentos do jogo distintos, ora com os franceses roubando a bola e transitando com velocidade, ora com os poloneses mais entrincheirados no próprio campo. Nesse segundo cenário é que veio o gol francês, com uma troca de passes que mexeu a defesa da Polônia para um lado e para o outro antes de ter seu momento crucial. Exponho aqui o que vi do lance: 



Aqui temos o momento chave. Sinalizei a Polônia em bloco baixo com o ponta direita Kaminski descendo para o lado de Cash. O recuo/movimento de Mbappé é o momento em que tudo muda. Nesse segundo, o Cash ali precisa decidir se mantém ou se quebra a linha para encaixar/encurtar no atacante francês. Enquanto isso Giroud já está imaginando como sair da marcação do Kiwior. Vamos então ao próximo print:



Cash decidiu encurtar, mas Mbappé achou o passe entre ele e Glik, que estava alinhado ao lateral-direito e que tentou sair também. Inútil tentativa, pois os demais colegas davam condições. Giroud tomou a frente e finalizou muito bem. 

Vejam... É um gol de gênio de Mbappé? Acho que não. É mais uma combinação com o tempo certo! Isso pode ser feito por outros times e mais vezes. Aqui houve técnica e capacidade, mas não é só aquela história de "contra defesa fechada só a qualidade individual". Não só. 

Esse gol, como dito, resolveu a partida, já que a Polônia teve que atacar e é difícil dela saber como. Por mais que o primeiro tempo tenha sido bom, a etapa complementar mostrou as limitações do time enquanto coletivo. 


*****

Vamos para o jogo da Inglaterra. Contra Senegal os ingleses estavam presos na boa marcação dos africanos quando o English Team tinha a bola no campo de defesa. De forma muito semelhante aos Estados Unidos, os senegaleses usaram os atacantes para fechar linha de passe dos zagueiros para os volantes e depois encaixaram marcação com volantes em Rice e Bellingham, laterais com pontas e pontas com laterais. Estava muito difícil de sair. Até que veio a combinação de passes por meio de uma rotação de posições. 



Shaw quer encontrar Bellingham (circulado), mas como Bellingham está marcado, Shaw aproveita a pequena brecha aberta e faz um passe para frente para Foden (linha preta). 

Na imagem abaixo podemos ver que Foden já pode dar a bola para Bellingham, mas o passe de letra é ainda melhor e encontra Kane.  


Quem estuda futebol chamaria um passe de Foden para Bellingham de "encontrar o terceiro homem". Essa expressão é usada para falar de um passe que tem como destino não aquele que recebe e sim um terceiro. No caso, como disse, Shaw quer Bellingham, mas usaria Foden como escala. 

Como o passe foi para Kane e depois para Bellingham, dá pra falar em "encontrar o quarto homem". Passe de Shaw era para Bellingham, mas teve duas escalas (Foden e depois Kane). Eu ouço pouco essa de quarto homem. Acho que poderíamos falar que a sequência meio que reseta e vira de novo terceiro homem a partir do Foden, mas enfim... Isso não é importante! O importante é a riqueza tática dessa movimentação combinada e coordenada e o que ela representa para o jogo: 



Depois disso Senegal ruiu e os ingleses ganharam merecidamente. 

Isso tudo que eu falei aqui é minha percepção como jornalista que estuda e analisa o jogo. Posso ter cometido erros ou exagerado nos termos... Sempre estou no limbo entre ignorância e arrogância quando falo de futebol, pois sei mais que o torcedor comum, mas menos do que quem trabalha com o esporte de alto nível. Esses pensamentos sobre comunicação e o jogo estão sempre na minha cabeça.

Todos concordamos que o jogo está cada vez mais estudado e que há padrões e jogadas que os times ensaiam, treinam e colocam em prática. A complexidade e a maneira como isso é feito e atingido, no entanto, muitas vezes tornam esse conteúdo fechado para o jornalista ou distante da compreensão do profissional de comunicação. 

E enquanto isso a maior parte do público e das emissoras quer cada vez mais o simples e o simplório, levando a um ciclo de retroalimentação e desconexão. 

Ora, se os times jogam de forma cada vez mais complexa e a comunicação sobre isso é cada vez mais simplória, então estão cada vez mais distantes os que jogam, dos que analisam e dos que assistem... 

Talvez deva ser assim mesmo... 

Mas olhem a riqueza que perdemos!