quarta-feira, 30 de novembro de 2022

Dudzicopa 12 - Pra quê Polônia?

O décimo primeiro dia de Copa do Mundo me fez pensar no que é o esporte e porque nos envolvemos com ele. 

Tenho convicção de que o esporte não é feito para times como a seleção polonesa de futebol e estou certo de que ninguém se envolveria e se interessaria pela modalidade se todos adotassem a postura do time dirigido por Czeslaw Michniewicz. 





Diante da Argentina os poloneses fizeram uma demonstração ímpar de antidesportividade.
No maior evento esportivo do planeta, com outras equipes dependendo de seu jogo, com seus principais jogadores em campo, com todos os 11 em condições físicas e técnicas, os poloneses decidiram não jogar. 

Não estou falando de "se defender com muita gente", "recuar as linhas" ou "ser inteligente para jogar no erro do adversário". Estou falando de um time que não quis jogar o jogo. De novo: a Polônia não quis jogar o jogo. Ela desistiu de jogar. Estava perdendo e decidiu que não tentaria mais ganhar. Foi isso o que aconteceu.

Por isso considero antidesportivo o que aconteceu. Porque para existir esse esporte é preciso que haja disputa. Que haja participantes interessados em vencer. Isso não aconteceu hoje. A Polônia perdendo por 2 a 0 decidiu aceitar. Decidiu deixar a bola com o adversário e esperar o tempo passar. Não tentou ganhar. Sequer esboçou reação. Aceitou que seria derrotada. É permitido? Sem dúvida. Mas está em consonância com o que se espera da prática esportiva? De nenhuma forma. Mesmo que a classificação estivesse ao alcance ao fazer isso. 

"Ah, mas isso é irrelevante, o importante é ganhar". Eu não acho. Ganhar é algo ínfimo perto da magnitude do esporte. 

Nesse sentido, compartilho com vocês algo que me fez organizar melhor os pensamentos sobre o tema. São trechos do livro Homo Ludens, do historiador e linguista holandês Johann Huizinga. Nele o autor se propõe a traçar uma história da humanidade mediante o aspecto lúdico.

Huizinga sustenta que seria impossível a existência da civilização sem elementos lúdicos, uma vez que esses carregam simbolismos que permitem aos seres humanos saírem da lógica apenas da sobrevivência. Nessa abordagem, quase tudo que não é sobrevivência acaba caindo no lúdico, uma vez que extrapola o domínio da necessidade. Assim, Huizinga trata em cada capítulo conceitos de Jogo (atividade que existe apenas com a ludicidade da relação entre pessoas)  na política, justiça, poesia, relacionamentos etc,  


Diz ele sobre o jogo: 

"Enumeremos uma vez mais as características que consideramos próprias do jogo. É uma atividade que se processa dentro de certos limites temporais e espaciais, segundo uma determinada ordem e um dado número de regras livremente aceitas, e fora da esfera da necessidade ou da utilidade material. O ambiente em que ele se desenrola é de arrebatamento e entusiasmo, e torna--se sagrado ou festivo de acordo com a circunstância. A ação acompanhada por um sentimento de exaltação e tensão, e seguida por um estado de alegria e de distensão."

Ainda sobre o jogo, Huizinga diz que: 

"A vida social reveste-se de formas supra biológicas, que lhe conferem uma dignidade superior sob a forma de jogo, e é através deste último que a sociedade exprime sua interpretação da vida e do mundo. Não queremos com isso dizer que o jogo se transforma em cultura, e sim que em suas fases mais primitivas a cultura possui um caráter lúdico, que ela se processa segundo as formas e o ambiente do jogo"
O esporte é desnecessário e por isso pode ser grandioso! Simbólico, construtor de novas realidades, dignificante, ideológico, reflexivo, filosófico... Nessa noção, o que a Polônia fez é inadmissível para mim. E olha que sou neto de um polonês! 

Para mim é também inadmissível porque o time não é ruim em valores individuais. É só que o treinador não quer jogar. Quer ir se agarrando em contas, números e avanços que na verdade significam muito pouco dentro do que poderia ser a experiência de uma Copa do Mundo para um povo, para os amantes do esporte e para as pessoas em geral. 

Mas enfim. Eu sou meio estranho mesmo.
Meio bobo.
Sonhador.

Está lá a Polônia. Nas oitavas de final!

Eu só pergunto... Pra quê? 

2 comentários:

  1. Concordo totalmente, apática, sem vontade. Isso é ruim e mostra até o que é desanimo e conformidade com o ruim.

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  2. Exatamente! Essa história de "deu certo então é bom" é algo que precisamos combater. Obrigado por ter lido!

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