domingo, 9 de agosto de 2015

Timing errado, decisão nem tanto...

Qualquer análise bem fundamentada exige distância entre o observador e observado. Vou tentar ao máximo fazer isso para falar da saída de Marcelo Bielsa do Olympique de Marseille.

A decisão tomada neste sábado, logo após o primeiro jogo e primeira derrota do clube no campeonato, pegou todos de surpresa. Afinal de contas o treinador argentino fez todo o processo de pré-temporada e disse na quinta-feira que estava tudo certo para que ele seguisse no clube até 2016 e provavelmente até o final da temporada 16-17. No entanto, uma ressalva foi feita: "está tudo acertado, mas não assinado".

Pois é... Segundo Bielsa,  na quarta-feira  houve uma reunião dele com o diretor geral do clube, Philippe Pérez, e o advogado Igor Levin, representante de Margarita Louis-Dreyfus, dona do clube. Na versão do argentino, pontos importantes do que estava acertado foram modificados e por isso a permanência se tornou inviável. Bielsa alega que não seria capaz de confiar mais no projeto do Olympique em meio a esta mudança.

O argentino não quis revelar quais foram os pontos e o presidente da agremiação, Vincent Labrune disse que se tratavam apenas de "questões técnicas". Já no domingo o Olympique de Marseille divulgou uma nota dizendo que "os interesses de um único homem jamais poderiam ficar acima do interesse do clube". Pelo que é possível depreender a decisão foi tomada antes do jogo contra o Caen, de forma que a derrota não deve ter influenciado em nada.

Bom, dito isto... Bielsa está errado no timing. Se havia pontos que poderiam ser passíveis de uma saída do clube, isso deveria ter sido discutido antes da pré-temporada... E se o técnico apenas confiou na palavra do presidente, esperando que nada mudaria, foi ingênuo... O Olympique de Marseille, no entanto, foi mais...

Como pode um clube deixar de assinar um contrato novo e ficar à mercê do treinador desta forma? Durante três meses de preparação?  Resposta: não havia jeito.

A chegada de Bielsa ao clube pode não ter rendido títulos ao Olympique, mas gerou toda uma gama de benefícios que fizeram o treinador ser indispensável. O estilo de jogo ofensivo, a boa fase no início da temporada passada e a própria postura do comandante cativaram o torcedor de tal forma que a média de público do Marseille em casa subiu de 37 mil 842 no campeonato 2013-14 para inacreditáveis 52 mil 917 no último ano!

Mais: a atenção que o time passou a receber tanto pelo estilo quanto pela curiosidade sobre Bielsa fez com que o clube ganhasse páginas de sites, jornais e programas de rádio e televisão em muitas outras partes do mundo, algo que o outrora imenso e hoje grande Marseille recebeu de muito bom grado!

E claro, houve os ganhos financeiros diretos que perpassam venda de ingressos e merchandising. O time que terminou o campeonato francês em sexto na temporada 2013-14 perdeu o seu principal jogador, Mathieu Valbuena, não teve reposição à altura (Barrada, Alessandrini, Batshuayi e Dória foram as contratações, sendo todas apostas pro futuro) e mesmo assim brigou pelo título por 3/4 do torneio, obtendo uma vaga na Liga Europa como consolo. Além disso o clube faturou 40,6 milhões de euros com as vendas de Imbula e Payet nesta janela (tinham sido comprados por 17). Ou seja... o treinador contribuía de tal forma para o planejamento de longo prazo que o Marseille não podia abrir mão de tal profissional, mesmo que a forma de trabalho soasse "ofensiva" pelas exigências e atitudes até certo ponto insubordinadas...

O pior, no entanto, é que o Marseille achou que Marcelo seria o suficiente e aceitaria de novo qualquer coisa. Além de Imbula e Payet, o clube perdeu de graça Ayew, Gignac, Morel e Fanni, ou seja: seis titulares deixaram o time de uma temporada para outra. O efeito negativo poderia ser mitigado por meio da chegada de bons nomes, mas, tal qual no outro mercado de transferências, os grandes reforços não vieram. É bem verdade que desta vez ao menos alguns pedidos do treinador foram respeitados, casos do zagueiro Rekik, do atacante Ocampos e do lateral Manquillo, mas os meias-atacantes Nkoudou (que veio do Nantes e tem 20 anos) e Sarr (23 anos, ex-Metz) não podem ser chamados de substitutos à altura dos que saíram, tampouco Diarra e Diaby, que juntos somaram 67 minutos na última temporada e que foram ideia do presidente....

Em suma: o Olympique apostava em Bielsa e apenas em Bielsa para ter um ano digno. Veio a negociação de contrato e as exigências do argentino.. A torcida o ama, a mídia estrangeira o observa, o estilo de jogo pode render resultados... Tem como dizer não aos termos do contrato? A princípio o clube pensava que não, mas depois achou que sim... Bielsa não queria seguir emprestando carisma, credibilidade e competência a quem não confiava e foi embora.

Timing errado... Decisão não tanto....

O Marseille segue, Bielsa segue, mas foi um triste fim para um casamento que rendeu tantos jogos memoráveis na temporada passada.










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